E se a gente soubesse onde tudo acaba? Será que ainda teríamos coragem de fazer as mesmas escolhas?
Por Fernanda Ferreira
Tenho certeza de que você já ouviu essa pergunta alguma vez na vida: “O que você faria se tivesse escolha de mudar alguma coisa do passado?”
Talvez você tenha respondido que mudaria algum erro que cometeu, algum arrependimento que ficou escondido debaixo da sua pele como uma farpa bem pequena que parece que não está ali mas sempre dói muito só por você esbarrar nela, mudaria alguma decisão que não tomou na hora certa ou deixaria de tomar alguma decisão que foi precipitada e não te trouxe alguma coisa boa no fim.
E também digo que talvez você, muito tempo depois, reconsidere sua resposta e responda que não mudaria nada. Porque acaba percebendo que se não fossem aquelas decisões, aquelas escolhas erradas, aqueles erros que não tiveram volta, aquelas situações que não lidou de forma tão sábia, entre tantas outras, se não fossem elas, você não estaria aqui.
Existe um livro chamado “A biblioteca da meia-noite”, nele o autor Matt Haig explora muito essa reflexão de como seria nossa vida se tivéssemos feito outras escolhas. Tendemos a superestimar as escolhas de alto impacto, como aquelas que nos demandam grande tomada de decisão, que causariam um enorme impacto imediato, aquelas que precisamos pedir conselhos e ponderar por dias antes de decidir, e subestimamos as escolhas de baixo impacto como se elas não fizessem diferença no final das contas.
Mas acontece que cada pequena decisão importa, cada pequena decisão abre um leque enorme de possibilidades na nossa vida. O que aconteceria se você não tivesse ido a algum lugar específico que te fez conhecer o amor da sua vida? O que aconteceria se você tivesse dito sim para aquele encontro sem graça que você inventou uma desculpa qualquer pra faltar? O que aconteceria se você não tivesse dado ouvidos ao seu medo quando quis dar chance para o desconhecido? Quando quis arriscar? O que aconteceria se você tivesse dito outras palavras para aquela pessoa que você viu pela última vez?
A Biblioteca da Meia-Noite funciona quase como uma metáfora emocional e literária do universo em bloco, uma teoria que desafia a nossa percepção intuitiva de passado, presente e futuro, como se transmutássemos sobre várias realidades paralelas e como se esses três estados do tempo coexistissem ao mesmo tempo. No livro, Matt Haig explora a ideia de que cada escolha gera uma vida diferente, e todas essas vidas são igualmente reais, acessíveis, e coexistem. Imagine um livro em que você pode estar na página 34, mas as páginas 1 a 140 continuam existindo ao mesmo tempo no livro.
Porque, no final, a ideia de que todas as vidas possíveis coexistem desafia a culpa, o arrependimento e o medo de ter feito a escolha errada. Em vez de pensar "e se eu tivesse feito diferente?", o livro (e a teoria) diz: “essa vida também existe em algum lugar”.
É como se o livro dissesse: “você não perdeu uma oportunidade, só não está vivendo essa versão agora”.
Logo, o único lugar possível onde tudo começa e termina somos nós mesmos. Funcionando como uma engrenagem cíclica, quase cármica, do universo. Tudo acaba na próxima decisão e outra vida surge a partir dela também.
Não adianta pensar que você poderia ter feito diferente se soubesse onde suas decisões te levaram. Talvez, essa vida, desse jeito que você sabe, é a melhor realidade que você poderia estar vivendo entre tantas outras. Talvez, se não fosse essa realidade, você não teria a capacidade de viver um futuro brilhante que já existe e você ainda não conheceu.